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Compliance é dever dos controladores

Acionistas controladores e administradores têm deveres de lealdade em relação à sociedade. Trata-se de conhecido pilar do regime das sociedades empresárias. Em sua formulação genérica, é uma regra de fácil compreensão à qual ninguém se opõe. Sua elaboração prática, entretanto, é bem mais complexa, como mostram os crescentes litígios.

Uma das questões ainda não respondidas de forma final no Brasil é: há responsabilidade do acionista controlador que nomeia uma administração causadora de ilegalidades e não a supervisiona de forma adequada?

A Lei das S.A. define um verdadeiro dever de lealdade e uma série de outros deveres gerais, a fim de se evitar a prática de abuso de poder. Tais deveres são chamados de fiduciários, pois o acionista controlador possui especial poder de influência sobre a gestão dos negócios da sociedade. Na doutrina defende-se que o dever de lealdade do controlador deve ser medido com fundamento no princípio da boa-fé objetiva, que contém um dever de diligência.

A discussão efetividade talvez seja o tópico mais debatido entre profissionais de compliance, e há poucas conclusões definitivas

No Brasil, fala-se em princípio no dever fiduciário dos administradores. Mas o desenvolvimento da prática acabou por assimilar e consolidar ao menos parte de tais deveres também no controlador. No caso brasileiro, com frequência existem controladores familiares que, por conta de funções e influência, são peças importantes na estrutura de governança das sociedades. Assim, quando o controlador está presente nessa estrutura, os deveres fiduciários devem-se aplicar de maneira ainda mais clara.

Respeitar a lei, além de pressuposto ético, constitui requisito operacional para o sucesso da companhia. Exemplos recentes demonstram que a condução de negócios em desconformidade com a lei é ineficiente, custoso e contrário aos interesses da companhia e dos acionistas. Casos extremos podem até mesmo resultar na proibição da celebração de contratos públicos ou, no caso de práticas anticompetitivas, na determinação da cisão da sociedade ou da transferência do controle societário.

Num cenário em que conformidade influi diretamente no sucesso dos negócios, é dever do acionista controlador orientar a companhia ao emprego de métodos que mantenham a empresa no rumo da lei? Ou seja, a opção por não se preocupar com a conformidade legal representa uma política contrária aos melhores interesses da companhia? A meu ver, a resposta é sim.

Deveres fiduciários genéricos concretizam-se nas normas que disciplinam a atividade empresarial, especialmente nos casos de responsabilidade objetiva, que criam deveres de comportamentos concretos independentemente de dolo ou culpa do agente.

É o que ocorre, por exemplo, nas normas de proteção e defesa da concorrência. Age em transgressão ao dever de obediência quem pratica um dos atos indicados como anticompetitivos. Situação idêntica ocorre na Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), que sanciona atos lesivos contra a administração pública nacional ou estrangeira. Ambos independem de culpa em larga medida.

Neste ponto, a principal questão passa a ser como cumprir com tais deveres. Qual a forma de desincumbir o controle e a administração do dever de cuidado e diligência que deles se espera?

A resposta curta é a estruturação de um programa de compliance. Porém, qual programa? Nem todos programas conduzem aos mesmos efeitos. É crucial que seja efetivo ou, ao menos, empregue as melhores técnicas para esse fim.

Um dos efeitos colaterais da febre de compliance dos últimos anos é a proliferação de “programas de papel”. Esses são, em geral, soluções de prateleira apresentadas a empresas sem que se leve em conta a verdadeira exposição de ao risco e a cultura organizacional.

A discussão efetividade talvez seja o tópico mais debatido entre profissionais de compliance, e há poucas conclusões definitivas. Ao final das contas, trata-se de saber se a empresa está preparada para perder um negócio em troca de fazer a coisa certa.

A aferição da qualidade do programa, sempre caso a caso, pressupõe a existência simultânea de três elementos: ambiente corporativo favorável a uma cultura de conformidade, o que envolve o apoio da alta direção e alinhamento de incentivos para o cumprimento da lei; disponibilização dos recursos necessários para a execução do programa; e autoridade para adotar as medidas necessárias de fiscalização e correção.

Se tais elementos não estiverem presentes é possível cogitar a quebra de deveres e responsabilidade junto à sociedade, acionistas e terceiros.

Este tópico abre diversas questões a serem exploradas. Falhas pontuais de compliance são suficientes para criar responsabilidade ou é necessário comprovar falhas sistêmicas? É necessário constatar uma prática ilícita ou apenas a falta de adoção de medidas efetivas já é suficiente? Essas questões ainda estão em aberto e serão resolvidas conforme os casos concretos se colocarem no Judiciário ou arbitragem.

 

Fonte: Valor Econômico

 

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