Nas operações comerciais a concessão de descontos e bonificações é prática comum e necessária.
Como desconto incondicional traduz-se aquele desconto concedido independentemente de qualquer condição futura, não sendo ainda necessário para configurá-lo que o adquirente pratique ato subsequente ao de compra para fruir do benefício.
Por sua vez, nas operações com produtos bonificados, o fornecedor entrega ao adquirente uma quantidade de produto maior do que a quantidade contratada, sem acréscimo ao preço total.
Assim a “bonificação”teria a mesma natureza de um desconto concedido, uma vez que, na operação, apesar de não haver redução do preço aumenta-se a quantidade de produtos comercializados.
Com base nesses conceitos, a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CSRF) do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), deu provimento ao Recurso Especial[1] de contribuinte para afastar a tributação do PIS e da COFINS dos descontos e bonificações, visto que a tais modalidades não se confere a natureza de receita, devendo, ambos os casos serem tratados como “redutores de custo”
Da alteração de entendimento do CARF
Anteriormente a Primeira Turma (4ª Câmara e 3ª Seção de Julgamento CARF) havia decidido que valores recebidos à título de descontos e bonificações constituiriam RECEITA. Discordando de tal entendimento, o contribuinte, em grau de Recurso, obteve êxito junto a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais e assim foi vencida a discussão com voto de desempate pró-contribuinte.
O voto vencido, defensor do anterior entendimento, baseava-se na tese de que ao se avaliar a natureza jurídica dos descontos comerciais e das bonificações, seriam estes enquadráveis como receita, um vez que o valor pago, e que, não constando das notas fiscais, deveriam ser considerados ingressos e ou recebimentos e, portanto, não seriam classificáveis como “bonificação e desconto” efetivamente, o que por conclusão deveriam integrar a base de cálculo das contribuições Pis e COFINS.
Voto vencedor e os descontos incondicionais
Entretanto, o voto vencedor mudou tal entendimento e concluiu que na operação junto ao fornecedor, a principal conta contábil a ser registrada pelo adquirente é, por evidente, a de custo de aquisição, afastando assim a natureza classificatória fiscal-contábil de “receita auferida”.
Isto porque ao ser concedido desconto ao adquirente, a única conta contábil a se considerar, para efeito de convergência entre o conceito jurídico e a escrituração contábil fiscal seria a utilização da conta “custo de aquisição” e, por coerência tal desconto deve ser tratado como redutor desse custo.
O debate acerca da natureza destes descontos trouxe o julgado do STJ (Agravo em Recurso Especial 556050/RS) no qual restou consignado a ilegalidade da IN 51/78 ao propor vinculação ao conceito de desconto incondicional com o condicionante de descrição em nota fiscal, nos seguintes termos:
“Percebe-se que essa decisão clarificou que a caracterização do desconto como incondicional, inclusive, para fins de PIS e COFINS, não deve estar condicionada, tal como entende a autoridade fazendária, a descrição do referido desconto na nota fiscal de aquisição dos bens, vez que considerou ilegal a IN 51/78. Sendo assim, se os descontos incondicionais juridicamente se enquadrarem como tais, independentemente da descrição ou não na nota fiscal, é de se considerar como parcela redutora do custo de aquisição para a adquirente.”
Ainda, a questão foi avaliada sob a primazia e importância do aspecto econômico em detrimento do aspecto meramente formal, enaltecendo a tese desde a muito advogada pelo contribuinte, quanto a importância da essência econômica na avaliação de uma operação e sua tributação, sendo necessário, por óbvio, a convergência entre os lançamentos e a escrituração contábeis a dar suporte a operação.
“Com efeito, aclara-se a preocupação com os fenômenos do ambiente empresarial e negocial – o que se direciona a primazia do aspecto econômico em relação ao aspecto formal. Sendo assim, vê-se que a escrituração contábil deve corresponder a realidade dos fatos que afetam o patrimônio, devendo-se adequar à natureza de cada um desses fatos – imperando, para tanto, a essência econômica. Mas, veja-se, que o registro contábil, para tanto, deve estar em convergência com o conceito jurídico do evento”.
Voto vencedor e as bonificações
A respeito das bonificações aduz o voto vencedor que nas operações com produtos bonificados, o fornecedor entrega ao adquirente uma quantidade de produto maior do que a quantidade contratada, sem acréscimo do preço total.
“A bonificação, de per si, tem a mesma natureza de um desconto concedido, pois o vendedor, apesar de não reduzir o preço, aumenta a quantidade de produtos. O que, por conseguinte, resulta na diminuição do valor unitário do bem – ou seja, redução de custo.”
Tal como nos descontos incondicionais, a bonificação não confere constituição de receita, vez que os produtos bonificados não implicam também em valor maior de créditos no regime não cumulativo. Assim, as mercadorias recebidas como bonificações igualmente não integram a base de cálculo de PIS e de COFINS.
O voto também fez alusão ao disposto na Súmula nº 457 do STJ[2] (que teve como motivação o Recurso Repetitivo REsp 1.111.156-SP) no qual restou decidido que a bonificação é uma modalidade de desconto que consiste na entrega de uma maior quantidade de produto vendido em vez de conceder uma redução do valor da venda.
Apesar do adquirente das mercadorias ser beneficiado com a redução do preço médio de cada produto isso não implica em redução do preço do negócio realizado.
Esta alteração no entendimento do CARF e, portanto, da Jurisprudência Administrativa, é de extrema relevância às operações comerciais e traz alto impacto na tributação das contribuições.
Assim os descontos incondicionais, bem como as bonificações, considerados e tidos como “redutores de custo”, com o devido alinhamento jurídico-contábil garante a correta conceituação e enquadramento para a não incidência do PIS e COFINS, sendo que a busca da adequada escrituração fiscal e contábil da operação é fundamental.
Trata-se assim de importante decisão e modificação jurisprudencial em benefício do contribuinte (adquirente) e merece toda a atenção uma vez que a fixação de conceitos implica na implementação de novas práticas nas suas operações comerciais diante da não incidência das contribuições PIS e COFINS.
Uma vez que este julgado muda o entendimento administrativo até então praticado, há que se observar nas operações, a forma de tratamento tributário dada aos descontos incondicionados e bonificações.
Estes, excluídos da base das contribuições PIS e COFINS, vez que classificáveis (jurídico e contabilmente) como redutores do custo de aquisição não deverão mais ser tratados como receitas.
EQUIPE TRIBUTÁRIA da BP&O Advogados Associados
13.12.2022
[1] Processo nº 10480.722794/2015-59 Recurso Especial do Contribuinte Acórdão nº 9303-013.338 –
CSRF / 3ª Turma Sessão de 20 de setembro de 2022
[2] SÚMULA n. 457 Os descontos incondicionais nas operações mercantis não se incluem na base de cálculo do ICMS.